sábado, 18 de abril de 2009

BOM EXEMPLO

Do site amazonia jornal, em 18.04.2009

O box da Polícia Militar (PM) que funciona na rua Osvaldo de Caldas Brito, bairro do Jurunas, foi reinaugurado ontem pela manhã. O local passou por uma reforma, custeada pelos próprios moradores da área, através do Centro Comunitário que tem o mesmo nome da rua. Cerca de R$ 3 mil foram usados na reforma, que contou com trabalhos diversos, como: pintura, troca da parte elétrica e hidráulica, reforma no banheiro (onde foram colocados dois novos vasos e chuveiro), além da doação de caixa e bomba d’água e um fogão.
A inauguração contou com a presença do comandante da 4ª Zona de Policiamento (Zpol), major Brasil; do diretor da Seccional Urbana da Cremação, delegado Marco Antônio Duarte e do supervisor da Delegacia do Jurunas, delegado Emir Medeiros. Policiais que revezam plantões no PM Box e moradores também participaram da solenidade de inauguração do Box reformado.
O presidente do Centro Comunitário Osvaldo de Caldas Brito, Jorge Pojo, contou que a comunidade promoveu diversos eventos, como bingos dançantes e rifas, para arrecadar o dinheiro necessário à reforma. De acordo com ele, a intenção é proporcionar os policiais um maior conforto e estrutura de trabalho mais adequada. 'Com melhores condições de trabalho, os policiais certamente terão mais prazer em trabalhar', frisou.
De acordo com a sargento Cláudia Gama, trabalham no PM Box seis policiais por dia, sendo três no turno do dia e três no turno da noite/madrugada. 'Quando é necessário, nós acionamos viaturas que estão nas proximidades, e o trabalho tem surtido efeito positivo para a população', afirmou.
Segundo informações de Jorge Pojo, pelo menos 15 a 20 mil famílias são atendidas pelo policiamento comunitário do PM Box. Apenas na área da Osvaldo de Caldas Brito e transversais, são pelo menos cinco mil famílias.
A idéia é conseguir integrar ainda mais o trabalho da Polícia Militar e Polícia Civil com a comunidade, como lembra o chefe de operações da Delegacia do Jurunas, investigador Rafa. 'É preciso ter consciência de um novo modelo de polícia. No Box, por exemplo, os policiais não ficam mais atrelados àquele espaço, é preciso partir para a rua, para rondas, dialogar com a comunidade', enfatsizou.

De Santa Isabel

Do site orm, em 18.04.2009
Inquérito apura morte de menina de quatro anos após cirurgia em Santa Izabel.
A Polícia Civil do município de Santa Izabel, localizado no nordeste paranese, abriu inquérito para apurar as causas da morte de uma criança de 4 anos de idade. A menina morreu ontem pela manhã no Hospital Maternidade Santa Izabel, durante uma cirurgia na mão. O médico responsável pelo procedimento foi ouvido na tarde de ontem. A polícia aguarda o resultado do exame necroscópico, que comprovará o que provocou a morte da criança.
De acordo com o delegado Glauco Nascimento, que instaurou o inquérito policial, a menina deu entrada por volta das 8h30 no hospital com um quadro de inflamação em um dos dedos da mão esquerda. O cirurgião Gilberto Pessoa foi quem atendeu a garota. A criança recebeu uma anestesia geral, do tipo inalatória, para ser dado início à cirurgia. Por volta das 11h30, a menina teve uma parada cardiorespiratória. O médico resolveu transferir a paciente para Belém, mas ela não resistiu e morreu a caminha do Pronto-Socorro.
O corpo foi encaminhado ao Instituto Médico Legal de Belém para ser submetido a necrópsia. O médico Gilberto Pessoa foi convocado à prestar depoimento na condição de declarante. Outras pessoas de sua equipe também serão ouvidas pela polícia, informou o delegado Glauco. O resultado do exame necroscópico de Luana deve sair em uma semana. Após esse laudo, a polícia terá saberá se houve ou não erro médico.

INTERROGATÓRIOS

Do site www.delegados.org
Interrogatório
Coluna elaborada com técnicas de interrogatório

Técnicas comuns de interrogatório:
O moderno interrogatório é um estudo da natureza humana. A maioria de nós demonstra uma tendência para se abrir com pessoas que se parecem com a gente. É difícil parar uma vez que tenhamos começado a falar, e quando começamos a dizer a verdade, é difícil começar a querer mentir. Quando um policial diz que encontraram nossas impressões digitais na maçaneta interna de uma casa que foi assaltada dois dias atrás, ficamos nervosos mesmo se estávamos usando luvas durante o tempo que permanecemos ali dentro.
Salvo raras exceções, os policiais têm autorização para mentir a fim de fazer que um suspeito confesse alguma coisa. A lógica é que o inocente jamais confessará um crime que não cometeu mesmo se for confrontado com falsas evidências físicas que apontam seu envolvimento. Infelizmente nem sempre é assim (saberemos mais sobre confissões falsas na próxima seção), mas isso explica grande parte das razões por que a polícia tem permissão para empregar táticas enganosas nos interrogatórios.
A manipulação psicológica começa antes mesmo de o interrogador abrir a boca. O arranjo físico da sala de interrogatório é projetado para maximizar o desconforto e sensação de impotência do suspeito a partir do momento em que a pessoa entra ali. O clássico manual de "Interrogatório e Confissões Criminais" recomenda a utilização de uma sala pequena, com isolamento acústico e apenas três cadeiras (duas para os investigadores e uma para o suspeito), uma mesa e nada nas paredes. Isso cria um senso de exposição, estranheza e isolamento que aumenta a sensação de "tirem-me daqui" experimentada pelo suspeito durante o interrogatório.
O manual sugere também que o suspeito deve ser acomodado numa cadeira desconfortável, fora do alcance de controles como interruptores de luz ou termostatos, o que aumentará ainda mais o seu desconforto e criará um clima de dependência. Um espelho falso é um acréscimo ideal ao ambiente, pois aumenta a ansiedade do suspeito e permite que outros investigadores observem o processo e ajudem o investigador responsável a descobrir que técnicas estão funcionando ou não.
Antes de começar a técnica de nove passos de interrogatório de Reid, procede-se a uma entrevista inicial para se tentar definir a culpa ou inocência da pessoa. Durante esse tempo, o investigador tenta estabelecer uma ligação com o suspeito, geralmente valendo-se de conversas descontraídas que criam uma atmosfera livre de intimidação. Como as pessoas tendem a se identificar e confiar em quem se parece com elas, o investigador pode dizer que compartilha alguns dos interesses e crenças do suspeito. O objetivo aqui é fazê-lo começar falando de trivialidades, pois assim será mais difícil parar de falar (ou de começar a mentir) depois, quando a discussão se voltar para o crime.
Durante essa conversa inicial, o investigador observa as reações do suspeito - tanto verbais quanto não-verbais - para definir uma reação comparativa antes que a pressão de verdade comece a aparecer. Posteriormente, o investigador usará esse parâmetro como ponto de partida para comparações.
Um dos métodos usados para criar um comparativo consiste de perguntas feitas para que o suspeito acesse diferentes partes de seu cérebro. O investigador faz perguntas amigáveis que exigem recurso à memória (simples recordação) e perguntas que exigem raciocínio (criatividade). Quando o suspeito está se lembrando de alguma coisa, seus olhos em geral se moverão para o lado direito. Isso é apenas uma manifestação exterior de que seu cérebro está ativando o centro de memória. Quando ele está raciocinando sobre alguma coisa, seus olhos podem mover-se para cima ou para a esquerda, refletindo assim a ativação do centro cognitivo. O investigador então toma nota mental para se lembrar da atividade ocular do suspeito.
O próximo passo é dirigir as perguntas para o assunto em questão. O investigador fará perguntas básicas sobre o crime e cruzará as reações do suspeito com o comparativo para determinar se o suspeito está dizendo a verdade ou mentindo. Se o interrogador perguntar ao suspeito onde ele estava na noite do crime e este responder de forma honesta, ele estará utilizando sua memória, portanto seus olhos podem mover-se para a direita; se estiver criando um álibi, estará raciocinando e seus olhos poderão mover-se para a esquerda. Se o interrogador determinar que as reações do suspeito indicam malícia, e se todas as demais provas apontam para sua culpa, tem início o interrogatório de um suspeito culpado.
A técnica de Reid é a base do afamado manual de "Interrogatório e Confissões Criminais" que já mencionamos. Ela descreve nove passos ou tópicos que servem para conduzir um interrogatório. Alguns desses passos se confundem, e não existe um interrogatório "padrão"; no entanto, a técnica de Reid oferece um esboço de como o desenrolar do interrogatório pode ser bem-sucedido.
ConfrontaçãoO investigador apresenta os fatos do caso e diz ao suspeito que há provas contra ele. Estas provas podem ser reais ou podem ter sido inventadas. Via de regra, o investigador afirma categoricamente que a pessoa está envolvida no crime. O nível de estresse do suspeito começa a subir, sendo que o interrogador pode começar a se movimentar pela sala e invadir o espaço pessoal do suspeito para aumentar sua sensação de desconforto.
Se o suspeito começar a se inquietar, passar a língua pelos lábios ou ficar se arrumando (por exemplo, passando a mão pelos cabelos), o investigador interpreta esses fatos como sinais de mentira e sabe que está indo na direção certa.
Desenvolvimento de um enredoO interrogador cria uma história em torno dos motivos que o suspeito teria para cometer o crime. Desenvolver um enredo exige olhar nos olhos do suspeito para descobrir por que ele fez o que fez, qual seu pretexto preferido e que tipo de desculpa poderá fazer com que admita a prática do crime. O suspeito usa algum tipo específico de raciocínio com mais freqüência do que outros? Por exemplo, será que ele está disposto a jogar a culpa na vítima? O interrogador traça um esboço, uma história, à qual o suspeito pode se agarrar para arrumar uma desculpa ou justificar sua participação no crime, e a partir daí passa a observar o suspeito para ver se ele gosta daquele enredo. O suspeito está prestando mais atenção do que antes? Ele está balançando a cabeça afirmativamente? Caso positivo, o investigador continuará a expandir aquele enredo; caso contrário, ele começa tudo de novo com um novo enredo. O desenvolvimento de um enredo acontece em segundo plano durante todo o interrogatório. Quando desenvolve enredos, o interrogador fala com uma voz suave, tranqüila, para passar uma imagem amigável e tranqüilizar o suspeito com um falso senso de segurança.
Barrar as negativasDeixar que um suspeito negue sua culpa aumentará sua confiança, portanto o investigador tentará barrar todas as negativas. Às vezes ele diz ao suspeito que logo será sua vez de falar mas que, por ora, terá de ficar escutando. O investigador vigia as negativas desde o começo do interrogatório e interrompe o suspeito antes que este possa expressá-las. Além de manter baixo o nível de confiança do suspeito, barrar suas negativas também pode ajudar a acalmá-lo para que não tenha a chance de pedir a presença de um advogado. Se não ocorrer nenhuma negativa durante o desenvolvimento do enredo, o investigador assume que há um possível indicador de culpa. Se as primeiras tentativas de negação diminuem ou são barradas no decorrer do enredo, o interrogador sabe que encontrou uma boa história e que o suspeito está perto de confessar o crime.
Vencer objeçõesUma vez que o interrogador tenha desenvolvido todo um enredo com o qual o suspeito possa identificar-se, este poderá levantar objeções de natureza lógica e não meras negativas, algo como: "Eu nunca poderia ter estuprado alguém - minha irmã foi violentada e eu vi o tanto de angústia que isso causa a uma pessoa. Eu jamais faria isso com alguém". O investigador trata as objeções diferentemente das negações, já que as primeiras podem lhe render informações que servirão de munição contra o próprio suspeito. O interrogador pode dizer alguma coisa como: "Veja bem, é bom que você esteja me dizendo que jamais teria planejado esse tipo de coisa, que foi algo totalmente fora do seu controle. Você se importa com mulheres como se importa com sua irmã - foi só um erro isolado, não foi uma coisa repetida". Se o investigador fizer seu trabalho direito, a objeção pode até acabar parecendo uma confissão de culpa.
Atrair a atenção do suspeitoNeste instante, o suspeito já deve estar frustrado e inseguro a respeito de si mesmo. Ele pode estar à procura de alguém que o ajude a se livrar da situação. O interrogador tenta capitalizar essa insegurança fingindo estar do lado do suspeito. Ele tentará parecer ainda mais sincero à medida que continua a desenvolver o enredo e pode buscar uma aproximação física com o suspeito para envolvê-lo e tentar neutralizar qualquer tentativa de se livrar daquela situação. O interrogador pode usar gestos físicos de camaradagem e interesse, como pôr a mão no ombro do suspeito ou dar tapinhas em suas costas.
O suspeito perde sua determinaçãoSe a linguagem corporal do suspeito indicar rendição - cabeça entre as mãos, cotovelos apoiados nos joelhos, ombros arqueados - o interrogador aproveita a oportunidade para induzir o suspeito a confessar. Neste ponto, ele faz uma transição no enredo para oferecer algumas alternativas de possíveis motivos (ver o próximo passo) que forcem o suspeito a escolher uma razão pela qual teria cometido o crime. Aqui o interrogador faz todo esforço para estabelecer um contato olho a olho com o suspeito e assim aumentar seu nível de tensão e sua vontade de escapar da situação. Se nesse momento o suspeito começar a chorar, o investigador interpreta isso como um indicador positivo de culpa.
AlternativasO interrogador oferece motivos contrastantes em relação a algum aspecto do crime, às vezes iniciando com um aspecto de menor importância para não intimidar o suspeito. Uma alternativa se apresenta socialmente aceitável ("foi um crime passional"), ao passo que a outra é moralmente repugnante ("você matou ela por dinheiro"). O investigador cria um contraste com as duas alternativas até que o suspeito dê sinal de que está escolhendo uma delas, algo como um aceno com a cabeça ou sinais ainda mais positivos de rendição. A partir daí o investigador começa a apressar as coisas.
Fazer o suspeito começar a falarA confissão tem início no momento em que o suspeito escolhe uma das alternativas. O interrogador estimula que ele fale sobre o crime e pede a pelo menos duas outras pessoas que testemunhem a confissão. Uma dessas pessoas pode ser o outro investigador ali presente, a outra pode ser introduzida como fator de pressão para forçar uma confissão - ter de confessar diante de um terceiro investigador pode aumentar a tensão do suspeito e seu desejo de assinar uma documento para simplesmente poder sair daquele lugar. Introduzir outra pessoa na sala também faz o sujeito reiterar os motivos socialmente aceitáveis que teria para cometer o crime, reforçando a idéia de que a confissão é um bom negócio para ele.
A confissãoA etapa final de um interrogatório gira em torno de fazer com que a confissão seja admitida num processo criminal. O interrogador fará com que o suspeito escreva sua confissão ou a declare pessoalmente, registrando-a em vídeo. Nesse instante, o suspeito normalmente está disposto a fazer qualquer coisa para se ver livre do interrogatório. Ele confirmará que sua confissão é voluntária, que não foi coagido e assinará sua declaração na presença de testemunhas.
É preciso lembrar aqui que, se a qualquer momento o suspeito tiver a chance de requisitar um advogado ou invocar seu direito ao silêncio, o interrogatório precisa ser interrompido imediatamente. É por isso que é tão importante barrar as tentativas que o suspeito faz para falar logo nas primeiras etapas - o interrogatório termina se ele invocar seus direitos.
Os passos que acabamos de descrever representam algumas das técnicas psicológicas que os investigadores usam para extrair confissões dos suspeitos. Na prática, porém, um interrogatório nem sempre segue o manual de instruções. A seguir, vamos dar uma olhada em um interrogatório policial de verdade que terminou com uma confissão válida.
Interrogatório real:
Em 1º de setembro de 2003 o investigador Victor Lauria, do Departamento de Polícia de Novi, em Detroit, Michigan, usou seu treinamento na técnica de Reid para interrogar Nikole Michelle Frederick. Ann Marie, enteada de dois anos de Frederick, fora levada quase morta à sala de emergência de um hospital com sinais evidentes de graves maltratos físicos. Frederick era a principal responsável pela criança e estava cuidando de Ann Marie nos instantes que antecederam sua ida ao hospital. O interrogatório durou dois dias e Frederick foi acusada pelo crime logo depois da primeira sessão de perguntas.
O investigador Lauria começou com uma entrevista simples, falando sem intimidações com o objetivo de determinar o parâmetro comparativo das reações de Frederick:
Lauria: Que nota você daria a si mesma como mãe?Frederick: Bem, acho que, acho que sou razoável. Quero dizer, não sou muito severa nem rigorosa, sabe como é, eu deixo passar algumas coisas.Lauria: Como você descreveria a Ann Marie?Frederick: Ela é uma criança muito difícil. Ah, chora o tempo todo. Sempre querendo colo... digo, Annie simplesmente, quer dizer, ela sempre parece que levou uma surra. Ela vive subindo nas coisas, né? Eu sempre encontro um machucado, um arranhão, essas coisas, nas costas dela. As canelas dela estão sempre roxas. Como Frederick pareceu estar dando desculpas para as lesões de Ann Marie e procurando uma justificativa - "ela é uma criança muito difícil" - e uma vez que ela estava tomando conta da criança no momento em que as lesões aconteceram, Lauria pressupôs a existência de culpa e passou a interrogá-la. Ele partiu para uma sutil confrontação, deixando que Frederick soubesse de que modo ela seria descoberta:
Lauria: Há toda uma linha de investigação policial que pode determinar como as lesões aconteceram e há quanto tempo elas existem.Frederick: ... Eu nem sei se vai ser possível descobrir exatamente o que aconteceu porque a única pessoa que realmente sabe é ela, e vai ser extremamente difícil fazer ela dizer se aconteceu alguma coisa, né? Não quero ser rude ou coisa parecida, só queria saber quanto tempo isso vai demorar.Lauria: Bom, como eu disse, uma das coisas que podemos fazer com elas [as lesões] é datar o tempo desde seu aparecimento e dizer se são lesões novas, que acabaram de acontecer, ou se são lesões que já estão começando a sarar; sabe como é, né, os médicos e legistas pesquisam esses tipos de coisas...Frederick: Certo.Lauria: Você consegue pensar em algum motivo pelo qual eles determinariam se as lesões foram causadas nas últimas 24 horas e por que alguém suspeitaria que você fez isso?Frederick: Hmm, exceto pelo fato de eu estar lá, não, nenhum.
(...)
Lauria: Você suspeita de alguém que tenha feito isso?Frederick: Não. É isso que estou tentando te dizer, eu acho muito difícil acreditar que alguém fez isso com ela porque, como eu disse, nós teríamos escutado alguma coisa também, sabe como é ...Lauria: De todas as pessoas que estavam na casa ou foram lá na noite passada, relacione todas aquelas que você garante que jamais teriam feito alguma coisa para machucar a Ann Marie.Frederick: ... Eu sei que o John não faria. Sinceramente, não acho que Brian tivesse feito também.Lauria: Quem poderia garantir por você?Frederick: Hmm, talvez o John. Mas veja só, eu não acredito exatamente no que o médico está dizendo e nem que as lesões foram causadas por alguém, seja o que for.
O investigador Lauria começou a desenvolver um enredo baseado numa situação de perda de controle - Frederick não teria premeditado os maltratos, ela simplesmente não estava raciocinando com clareza. Só que Frederick não gostou do enredo. Ela perguntou ao investigador por que ele não acreditava em sua versão. Lauria passou então a lidar com a hipótese de que Frederick teria machucado Ann Marie numa perda de controle momentânea, talvez de frações de segundo. Ele explicou que, sem sombra de dúvida, os ferimentos de Ann Marie não foram resultado de uma queda. Outra pessoa causou os ferimentos, possivelmente numa "fração de segundo" de irracionalidade. Frederick agora estava ouvindo, aparentemente presa à tese da "fração de segundo". Lauria desenvolveu ainda mais aquele enredo mencionando a natureza problemática de Ann Marie e como era difícil tomar conta dela - jogar a culpa na vítima, uma tendência que já havia sido demonstrada pela interrogada. Frederick passou a fazer movimentos positivos com a cabeça e Lauria suscitou uma alternativa. Ele disse a Frederick que "sem uma explicação para o acontecido, as pessoas imaginariam o pior". O contraste implícito já tinha sido apresentado: uma agressão cruel e premeditada contra uma perda momentânea de autocontrole. A abordagem acabou funcionando. Em seu relato, Lauria afirmou o seguinte:
"Em dois dias de perguntas, Frederick jamais quis saber como Ann Marie estava passando. Já no fim da entrevista eu expus isso a ela. Ela tentou me convencer de que tinha perguntado várias vezes sobre os ferimentos de Ann Marie. Em seguida perguntou se eu sabia como a criança estava passando. Eu lhe disse que Ann Marie tinha sofrido morte cerebral e que provavelmente não teria condições de sobreviver. Aí Frederick declarou: 'Meu Deus. Eu vou responder por homicídio.' Depois disso eu passei mais 45 minutos jogando com outros enredos para tentar conseguir mais informações. Depois de negar várias vezes que tivesse mais informações ou envolvimento com os ferimentos de Ann Marie, ela acabou confessando que tinha sacudido a criança. Depois de confessar tê-la sacudido, Frederick não agüentou e começou a chorar. Então disse: 'Eu matei a garotinha. Eu matei a garotinha.'"
Ann Marie faleceu em decorrência dos ferimentos e Nikole Michelle Frederick enfrentou julgamento por homicídio qualificado. Ela foi condenada à prisão perpétua sem direito a liberdade condicional.
Obter a confissão de um suspeito é a melhor garantia de que ele será condenado em juízo e de que cumprirá a pena pelo crime que cometeu. O problema é que embora uma confissão pareça muito boa em juízo, isso não significa que ela seja um indicador infalível de culpa. Essa é a razão de grande parte da controvérsia que gira em torno das táticas de interrogatório policial.

Controvérsias:
A questão dos interrogatórios sempre foi um tema controverso. Todas as vezes que um agente de combate ao crime entra numa sala com um cidadão e fecha a porta, as pessoas começam a questionar o que acontece ali dentro. E todas as vezes que aquele agente deixa a sala com uma confissão, é certo que mais perguntas vão aparecer. A confissão foi obtida por coação? Será que a polícia violou os direitos do suspeito?
A verdadeira questão provavelmente é muito mais abrangente do que isso: será mesmo o interrogatório policial um processo justo? Como pode um sistema calculado para manipular e extrair confissões do suspeito não ser coercitivo? O debate sobre a imparcialidade e moralidade das técnicas de interrogatório policial é um debate permanente que possui muitas questões em primeiro plano.
Primeiramente, o interrogatório é um processo de culpa presumida. O objetivo é fazer o suspeito confessar. Uma vez iniciado o interrogatório, o investigador pode inconscientemente ignorar qualquer prova da inocência em sua busca por uma confissão. Trata-se de um fenômeno psicológico corriqueiro - as pessoas não raro "filtram" qualquer evidência que não se enquadre em seus pontos de vista predefinidos. O interrogatório é calculado para deixar o suspeito extremamente nervoso, porém sinais de estresse - como arrumar o cabelo e a inquietação - que são tomados como indicadores positivos de culpa podem muito bem indicar a tensão que sofre um inocente que está sendo acusado de um crime que não cometeu. Além disso, há o problema da coação latente. Embora os policiais possam não oferecer complacência de maneira explícita em troca da confissão, ou ameaçar com punição alguém que não está disposto a confessar, eles podem fazer promessas ou ameaças implícitas em sua linguagem e tom de voz. Por exemplo, quando o investigador Lauria disse a Nikole Frederick que "sem uma explicação para o acontecido as pessoas imaginariam o pior", Frederick pode ter interpretado isso como uma indicação de que se ela confessasse mas desse uma explicação para o crime, as conseqüências seriam menos severas do que se tivesse mantido a boca fechada.
De modo geral, grande parte da preocupação das entidades de defesa dos direitos humanos em relação ao interrogatório policial tem a ver com as nefastas semelhanças que as técnicas psicológicas guardam com as técnicas de lavagem cerebral. O interrogador está tentando influenciar o suspeito sem o seu consentimento, o que é visto como uma aplicação antiética das táticas psicológicas. Muitas das técnicas usadas para causar desconforto, confusão e insegurança no processo de lavagem cerebral são semelhantes àquelas utilizadas num interrogatório:
invadir o espaço pessoal do suspeito;
impedir o suspeito de falar;
usar alternativas de contraste extremo;
colocar a confissão como forma de escape. Quanto maior for o nível de tensão do suspeito, menos chance ele terá de raciocinar de maneira crítica e independente, ficando assim muito mais suscetível ao sugestionamento. Isso é ainda mais verdadeiro quando se trata de um suspeito menor ou doente mental, pois nesse caso a pessoa pode não ter todas as ferramentas necessárias para reconhecer e combater as táticas de manipulação. Um processo calculado para criar tanta tensão em alguém que a pessoa confessará simplesmente para se ver livre da situação é um processo suscetível de gerar confissões falsas. Os pesquisadores estimam que entre 65 e 300 confissões falsas são extraídas por ano nos Estados Unidos. Eis algumas confissões falsas descobertas pelos investigadores:
Peter Reilly, 1973Peter Reilly tinha 18 anos quando sua mãe foi encontrada morta na casa da família. Depois de ser interrogado por oito horas pela polícia de Connecticut, ele acabou confessando o violento homicídio da mãe. Com base em sua confissão, um júri o condenou por homicídio culposo e ele passou três anos na prisão, até que um juiz lhe concedeu liberdade diante de novas provas que apontavam outra pessoa como autora do crime.
Earl Washington Jr., 1982Earl Washington Jr., um homem descrito pelos psicólogos como uma pessoa "levemente retardada", com um QI de 69, confessou ter estuprado e assassinado uma mulher de 19 anos depois de passar por um interrogatório. Ele foi condenado com base apenas em sua confissão e passou 18 anos na prisão, metade desse tempo no corredor da morte. Apenas nove dias antes da data marcada para sua execução o governador da Virgínia concedeu-lhe indulto porque evidências baseadas em DNA revelaram que o verdadeiro agente do crime tinha sido outro homem.
Os "Cinco do Central Park", 1989Após mais de 20 horas de interrogatório, cinco adolescentes - Raymond Santana (14), Kharey Wise (16), Antron McCray (16), Kevin Richardson (14) e Yusef Salaam (15) - confessaram ter estuprado e espancado uma mulher que fazia cooper no Central Park, em Nova Iorque. Eles passaram entre 6 e 12 anos na prisão (dos cinco, quatro foram julgados quando ainda eram menores de idade) até que, em 2001, outro homem confessou ter praticado o crime. Evidências de DNA confirmaram que este outro homem era, de fato, o estuprador do Central Park.
Michael Crowe, 1998Michael Crowe tinha 14 anos quando a polícia o interrogou sem a presença de qualquer de seus pais ou outro adulto na sala de interrogatório. Ele acabou confessando ter esfaqueado sua irmã de 12 anos até a morte depois que o interrogador o iludiu dizendo que havia provas materiais contra ele. Crowe foi indiciado pelo crime, mas nas audiências pré-julgamento o juiz entendeu que sua confissão tinha sido involuntária. Evidências de DNA posteriormente levaram a polícia até o homem que realmente assassinou a garota.
O interrogatório de Michael Crowe foi todo registrado em vídeo sendo, e a fita auxiliou o juiz a definir que a confissão tinha sido involuntária. O simples fato de registrar a confissão em vídeo não atesta muita coisa sobre a legalidade do processo que resultou nela, sendo essa a razão por que os críticos das técnicas de interrogatório policial exigem a gravação obrigatória do início ao fim de todos os interrogatórios como um passo a ser tomado em direção à honestidade do processo. Outra solução possível para o problema seria treinar os policiais para reconhecerem indícios sutis de doença mental que tornam uma confissão falsa mais provável. Muitos membros da comunidade de repressão ao crime invocam os elevados custos como justificativa para não se implementar esse tipo de solução e argumentam que o problema das confissões falsas é exagerado pelos críticos. Ainda assim, a maioria das pessoas acha que uma única confissão falsa que resulte em condenação já é demais.
www.delegados.org


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quinta-feira, 2 de abril de 2009

Do site da Adepol, em 02.04.2009

DECISÃO: Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada contra ato da ilustre Delegada de Polícia da 9ª Delegacia de Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro, “que negou o acesso a cópia dos autos do Inquérito Policial nº 009- -01550/2009 aos advogados constituídos (...)” (fls. 02).

Sustenta-se, na presente causa, que o ato reclamado em questão teria transgredido o enunciado da Súmula Vinculante nº 14, que possui o seguinte teor:

“É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.” (grifei)

Sendo esse o contexto, passo a apreciar o pedido de medida liminar.

E, ao fazê-lo, observo que os elementos produzidos na presente sede reclamatória parecem evidenciar a alegada transgressão ao enunciado da Súmula Vinculante nº 14/STF, revelando-se suficientes para justificar, na espécie, o acolhimento da pretensão cautelar deduzida pelo reclamante.

Com efeito, e como tenho salientado em muitas decisões proferidas no Supremo Tribunal Federal, o presente caso põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que resultam de injustas restrições impostas ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV).

O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado aos procedimentos estatais, inclusive àqueles que tramitem em regime de sigilo (hipótese em que se lhe exigirá a exibição do pertinente instrumento de mandato) – assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal.

Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades emanados do aparelho estatal.

Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário.

A pessoa contra quem se instaurou persecução penal – não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República.

Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal:

“INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO.
- O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto 'dominus litis' - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária.
A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações.
O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.”
(RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado.

Cabe referir, nesse sentido, o magistério de FAUZI HASSAN CHOUKE (“Garantias Constitucionais na Investigação Criminal”, p. 74, item n. 4.2, 1995, RT), de ADA PELLEGRINI GRINOVER (“A Polícia Civil e as Garantias Constitucionais de Liberdade”, “in” “A Polícia à Luz do Direito”, p. 17, 1991, RT), de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 383, 1993, Saraiva), de ROBERTO MAURÍCIO GENOFRE (“O Indiciado: de Objeto de Investigações a Sujeito de Direitos”, “in” “Justiça e Democracia”, vol. 1/181, item n. 4, 1996, RT), de PAULO FERNANDO SILVEIRA (“Devido Processo Legal - Due Process of Law”, p. 101, 1996, Del Rey), de ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, p. 60/61, item n. 48, 7ª ed., 1998, Saraiva) e de LUIZ CARLOS ROCHA (“Investigação Policial - Teoria e Prática”, p. 109, item n. 2, 1998, Saraiva), dentre outros.

Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado ser, ele próprio, sujeito de direitos, que o Advogado por ele regularmente constituído (como sucede no caso) tem direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, ainda que em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente.

É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo - e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o acusado (e, até mesmo, o mero indiciado), por meio de Advogado por ele constituído, tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei).

Vê-se, pois, que assiste, àquele sob persecução penal do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 90.232/AM, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a persecução estatal esteja sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do acusado, desde que por este constituído (como sucede na espécie), poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548):

“Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.
A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.
O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei)

Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada:

“INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

- O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.
- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.”
(HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007)

Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em recentíssima obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem:

“No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7°, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1° do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7° não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5°, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei)

Cumpre referir, ainda, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado:

“ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei)

Cabe assinalar, neste ponto, um outro aspecto relevante do tema ora em análise, considerados os diversos elementos probatórios já produzidos nos autos da persecução penal e, portanto, a estes já formalmente incorporados. Refiro-me ao postulado da comunhão da prova, cuja eficácia projeta-se e incide sobre todos os dados informativos, que, concernentes à “informatio delicti”, compõem o acervo probatório coligido pelas autoridades e agentes estatais.

Esse postulado assume inegável importância no plano das garantias de ordem jurídica reconhecidas ao investigado e ao réu, pois, como se sabe, o princípio da comunhão (ou da aquisição) da prova assegura, ao que sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo -, o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da auto-defesa, quer para desempenho da defesa técnica.

É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado.

Essa compreensão do tema – cabe ressaltar - é revelada por autorizado magistério doutrinário (ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA, “Da Prova no Processo Penal”, p. 31, item n. 3, 3ª ed., 1994, Saraiva; DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “O Princípio da Comunhão da Prova”, “in” Revista Dialética de Direito Processual (RDPP), vol. 31/19-33, 2005; FERNANDO CAPEZ, “Curso de Processo Penal”, p. 259, item n. 17.7, 7ª ed., 2001, Saraiva; MARCELLUS POLASTRI LIMA, “A Prova Penal”, p. 31, item n. 2, 2ª ed., 2003, Lumen Juris, v.g.), valendo referir, por extremamente relevante, a lição expendida por JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“O Juiz e a Prova”, “in” Revista de Processo, nº 35, Ano IX, abril/junho de 1984, p. 178/184):

“E basta pensar no seguinte: se a prova for feita, pouco importa a sua origem. (...). A prova do fato não aumenta nem diminui de valor segundo haja sido trazida por aquele a quem cabia o ônus, ou pelo adversário. A isso se chama o ‘princípio da comunhão da prova’: a prova, depois de feita, é comum, não pertence a quem a faz, pertence ao processo; pouco importa sua fonte, pouco importa sua proveniência. (...).” (grifei)

Cumpre rememorar, ainda, ante a sua inteira pertinência, o magistério de PAULO RANGEL (“Direito Processual Penal”, p. 411/412, item n. 7.5.1, 8ª ed., 2004, Lumen Juris):

“A palavra comunhão vem do latim ‘communione’, que significa ato ou efeito de comungar, participação em comum em crenças, idéias ou interesses. Referindo-se à prova, portanto, quer-se dizer que a mesma, uma vez no processo, pertence a todos os sujeitos processuais (partes e juiz), não obstante ter sido levada apenas por um deles. (...).
O princípio da comunhão da prova é um consectário lógico dos princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico processual, pois as partes, a fim de estabelecer a verdade histórica nos autos do processo, não abrem mão do meio de prova levado para os autos.
(...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.” (grifei)

É por tal razão que se impõe assegurar, ao ora reclamante, por intermédio dos patronos que constituiu, o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos da persecução penal em causa, mesmo porque o conhecimento do acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a própria defesa do reclamante em questão.

É fundamental, como salientado, para o efeito referido nesta decisão, que os elementos probatórios já tenham sido formalmente produzidos nos autos da persecução penal.

O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o indiciado tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada (como no caso) ou processada pelo Estado, ainda que o procedimento de persecução penal esteja submetido a regime de sigilo.

O fascínio do mistério e o culto ao segredo não devem estimular, no âmbito de uma sociedade livre, práticas estatais cuja realização, notadamente na esfera penal, culmine em ofensa aos direitos básicos daquele que é submetido, pelos órgãos e agentes do Poder, a atos de persecução criminal, valendo relembrar, por oportuno, a advertência de JOÃO BARBALHO feita em seus comentários à Constituição Federal de 1891 (“Constituição Federal Brasileira – Comentários”, p. 323/324, edição fac-similar, 1992, Senado Federal):

“O pensamento de facilitar amplamente a defesa dos acusados conforma-se bem com o espírito liberal das disposições constitucionais relativas à liberdade individual, que vamos comentando. A lei não quer a perdição daqueles que a justiça processa; quer só que bem se apure a verdade da acusação e, portanto, todos os meios e expedientes de defesa que não impeçam o descobrimento dela devem ser permitidos aos acusados. A lei os deve facultar com largueza, regularizando-os para não tornar tumultuário o processo.
Com a ‘plena defesa’ são incompatíveis, e, portanto, inteiramente inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusado ou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob a coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas, e em geral todo o procedimento que de qualquer maneira embarace a defesa.
Felizmente, nossa legislação ordinária sobre a matéria realiza o propósito da Constituição, cercando das precisas garantias do exercício desse inauferível direito dos acusados – para ela ‘res sacra reus’” (grifei)

Sendo assim, em face das razões expostas, e considerando, ainda, os fundamentos que venho de mencionar, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a garantir, ao ora reclamante, por intermédio de seus Advogados regularmente constituídos, o direito de acesso aos autos de inquérito policial no qual figura como investigado (IPL nº 009-01550/2009 – 9ª Delegacia de Polícia Civil do Rio de Janeiro/RJ), sustando, em conseqüência, até ulterior deliberação minha, a realização do interrogatório do reclamante em questão, com data já designada para o próximo dia 16/03/2009 (fls. 02).

Observo, por necessário, que este provimento liminar assegura, ao ora reclamante, o direito de acesso às informações já formalmente introduzidas nos autos do procedimento investigatório em questão.